"Sempre há um quê de ridículo nas emoções
das criaturas que deixamos de amar."
Ele vive numa concha, que talvez não se abra nem por dentro. Você anda de roda, à espreita. Volta quando o tempo está melhor para reencontrar apenas a concha, seu conteúdo e silêncio. Volta de noite, às 00h00, aquela hora mágica em que tudo pode acontecer, para surpreender os mais belos espectáculos da natureza. A azáfama da vida que não tem tempo a perder, o degradê de verdes que acompanha a mudança das estações. Só a concha permanece oclusa. Eventualmente decide que ela é bonita, mesmo assim imóvel, e talvez abrigada das intempéries revele sua preciosidade. E a deixa um tempo na sala. Mas a moda dita mudanças na decoração e aqueles matizes já não combinam com as novas almofadas do sofá. Então passa para a varanda, e depois para o jardim onde seu sobrinho traquina a encontra e guarda no bolso para exibir aos coleguinhas.
De dentro talvez ele sinta essas atribulações, talvez a casca seja impermeável. A imobilidade é segura. E o seguro é chato. Mas isso ele já sabe também. A verdade é que, haja, não haja conteúdo, o mundo apenas vai conhecer a concha, e o conteúdo o continente. Há quem se contente com isso e chame de viver.
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