Rafael

Tem gente por quem vale a pena se apaixonar. Mesmo que seja mais um desses amores unilaterais cultivados em noites de insonia e desesperança. Rafael é assim. E cora. Como é lindo quando aquele homem (tão menino ainda!) cora. A vermelhidão charmosa escondia uma centelha de loucura que adoraria atear e fazer explodir. Tocou seu rosto como uma criança que acaba de descobrir uma possibilidade sem saber bem o que fazer com ela. Inventou uma desculpa qualquer perante o olhar que a interrogava. Tinha uma coisa aqui...
Mas ele não tinha notado a sua chegada nem perceberia agora a sua partida. Levaria a vida do mesmo velho jeito de sempre. Nunca se enganou quanto a isso. Sabia desde o principio que seria assim, mas era comedida. Lhe bastavam as migalhas que sobejavam incautas. Bom dia, sorriso, favores impessoais, abrir a porta, existir... Sorriu pensando que um dia ainda sorveria aquela dor aguada, diluida pelas páginas do calendário. Tudo a seu tempo. Enquanto isso degustaria suas caloricas porções de sofrimento até que ao fim. E então lamberia o prato e o deixaria para trás até à proxima refeição. Tudo a seu tempo.